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Justiça Demanda Penas Mais Severas
Nos últimos anos, a mídia tem noticiado com uma frequência espantosa o aumento nos casos de maus tratos aos animais. As notícias relatam situações que vão de abandono, abusos, testes de cosméticos até a repulsiva rinha de cachorros alvo de operação policial no final de 2019, que chocou todo o país. Ocorre que a defasada legislação brasileira não pune adequadamente os criminosos que praticam tais atos.
Por certo, não podemos deixar de ressaltar a importância na educação de todos, como um compromisso da população na batalha contra os maus-tratos e na cobrança de nossos representantes políticos em favor da dignidade dos animais. A imprensa também tem papel crucial nesse enfrentamento.
Maltratar não se trata exclusivamente de cometer violência física ou outro ato lesivo, mas também inclui o abandono, a negligência, como por exemplo, deixar de vacinar, abandoná-los na rua e outros tantos modos de causar sofrimento aos animais. Não basta somente saciar a sua sede ou fome. Eles precisam de amor.
Nós, seres humanos, também somos animais. Quando um homem tortura ou mata outro animal não humano, demonstram também ter um potencial de causar mal aos próprios seres humanos. Dessa forma, fica evidente que o combate aos maus-tratos está dentro do aspecto da moralidade. Os animais, muito embora sejam considerados “coisas” pela retrógrada legislação brasileira, encontram-se em posição equivalente a nós. Anseiam cuidado, amor e, sobretudo, deixar de sofrer. Devemo-nos preocupar com seu bem-estar e não os usar como objetos pessoais ou para fins de interesses econômicos.
Hoje, a legislação que dispõe acerca do crime de maus-tratos aos animas consiste na Lei nº 9.605, de 12 de fevereiro de 1998. A pena prevista para quem pratica este delito é a de detenção de 3 (três) meses a 1 (um) ano, e multa; sendo aumentada de um sexto a um terço, caso o animal venha a falecer (art. 32).
Fica claro que a punição prevista é muito branda para os que praticam condutas contra os animais, sejam elas comissiva ou omissivas. Talvez os legisladores à época da elaboração da Lei nº 9.605 não os enxergassem com a devida importância. Todavia, a referida lei, ainda que desatualizada com os atuais anseios de proteção aos animais, prevalece.
O crime de maus-tratos, devido ao tamanho da pena prevista na legislação, é considerado doutrinariamente de “Infração de Menor Potencial Ofensivo”, conceito jurídico utilizado para designar as transgressões penais de “menor relevância”, definidas como aquelas cuja condenação máxima, mencionada na lei, não ultrapassa 2 (dois) anos.
Para essas “Infrações de Menor Potencial Ofensivo”, aplicam-se as disposições da Lei dos Juizados Especiais (Lei nº 9.099/95). Por questões de política criminal, esta norma prevê medidas despenalizadoras ao autor. Ao transgressor, em tais casos, pode haver o oferecimento de um “acordo”, para que não venha ser processado criminalmente, porquanto ele preencha alguns requisitos legais. Em linhas gerais, aceitando tal acordo, não haverá oferecimento de denúncia contra o infrator (artigo 76) e este sequer terá antecedentes criminais.
Na situação hipotética de o agente do delito não aceitar essa primeira proposta de acordo, o processo criminal irá ser deflagrado. Porém, mesmo após o oferecimento da denúncia, poderá ser sugerido ao agressor uma nova espécie de acordo, levando em conta que a pena mínima cominada na lei é igual ou inferior a 1 (um) ano: a “Suspensão Condicional do Processo”. Neste acordo, o processo criminal não continuará, desde que o infrator preencha alguns requisitos legais, como exemplo, que “não esteja sendo processado ou não tenha sido condenado por outro crime” (artigo 89).
Portanto, como se depreende de nossas leis, o direito penal ainda não se aflige com o crime de maus-tratos contra os animais da forma merecida com o qual deveria ser tratado, sendo permitido ao agressor livrar-se do processo, celebrando transações penais (“acordos”) perante o Juizado Especial Criminal.
Outro ponto importante é a possibilidade de o crime de maus tratos prescrever. No direito penal, quanto menor a pena cominada do delito, mais rápido deve agir a Justiça Criminal. Caso a Justiça demore, como de fato ocorre em nosso país, o autor do delito se vê livre de qualquer condenação. No caso dos maus tratos, a pequena pena cominada permite que o crime prescreva celeremente em face da morosidade da Justiça.
Diante desta grave omissão legislativa, na presente data, mesmo que alguém cometa uma atrocidade contra um cachorro ou gato, por exemplo, há grande possibilidade de tal criminoso “sair livre” e, mesmo sendo pego em flagrante delito; no máximo, cumprirá pequenas sanções como pagamento de cestas básicas, trabalho comunitário e ainda “ficar com sua ficha criminal limpa”. Para se ter ideia de tal aberração, caso alguém se apodere de um objeto “emprestado”, como um relógio, sua punição, na forma do art. 168 do CP, será maior do que a de alguém que matar um cachorro com crueldade.
As disposições em nossas leis para esse mal, com o atual avanço da sociedade, encontram-se demasiadamente defasadas, necessitando, urgentemente, de alterações objetivando a dignidade da vida animal, para que, ao menos, o infrator possa efetivamente vir a responder criminalmente perante a sociedade/Estado.
Por mais que o cenário pareça desfavorável aos defensores dos direitos dos animais, a batalha não pode parar. Algumas notícias boas em meio a tantas ruins mostram uma luz no fim do túnel.
Atualmente, encontra-se em trâmite no Congresso Nacional, o Projeto de Lei nº 1095/2019, que visa aumentar a pena aplicada a prática de maus-tratos. No teor do texto, a punição, nesses casos, passará a ser de 1 (um) ano a 4 (quatro) anos de reclusão somada a multa. Hoje em dia, como já exposto, ela é de 3 (três) meses a 1 (um) ano de detenção e multa. Agregada à aplicação da condenação, o texto prevê uma punição pecuniária a estabelecimentos comerciais que permitirem a prática de tal crime contra qualquer animal, no valor de até 40 (quarenta) salários mínimos, além da interdição do estabelecimento.
Também está em trâmite o Projeto de Lei Complementar – PLC 27/2018 - que modifica a natureza jurídica dos animais não humanos, propondo que eles deixem de ser considerados “objetos ou coisas” para se tornarem “sujeitos de direitos”, tratados como seres com natureza biológica, emocional e passíveis de sofrimento. O texto também acrescenta dispositivo à Lei dos Crimes Ambientais (Lei 9.605, de 1998) para determinar que os animais não sejam mais considerados “bens móveis” para fins do Código Civil (Lei 10.402, de 2002). Com essas alterações, os animais teriam uma maior proteção legal contra os maus-tratos.
Os mencionados projetos de lei demonstram grande evolução da sociedade. No entanto, para que haja notável modificação da dinâmica processual penal para esse tipo de crime, bem como para que não sobrevenham impunidades, uma nova lei é necessária para alterar, substancialmente, tanto a pena mínima quanto a pena máxima cominada a esse delito. Assim, a sanção mínima deveria passar da atual sanção de 3 (três) meses para MAIS de 1 (um) ano de reclusão, o que impedirá a “suspensão do processo”. Juntamente com essa mudança, poderia advir a transformação da pena máxima de 1 (um) ano para MAIS de 2 (dois) anos, impedindo a “transação penal”. Como exemplo, poderia se modificar a punição dos atuais 3 (três) meses a 1 (um) ano para de 2 (dois) a 3 (três) anos.
Alternativamente, num outro viés de alteração legislativa, poderia uma nova lei trazer alteração no sentido de proibir a aplicação da Lei dos Juizados Especiais (lei 9099/95) aos crimes de maus-tratos aos animais. Com isso, esses institutos despenalizadores ficariam impedidos de operar.
Faz-se necessário, ademais, que se deixe de legislar sob uma ótica quase que exclusivamente antropocêntrica, no intuito de nos aproximar de uma visão biocêntrica do Direito e dos fatos e evitando, assim, que a brandura quanto às consequências jurídicas desses crimes torne-se cada vez mais incoerente.
Como já apregoa a “Declaração Universal dos Direitos dos Animais” (UNESCO-ONU, 1978) em seu artigo 14: “Os direitos dos animais devem ser definidos por leis, como a dos homens”.
A dignidade da vida animal é tema tão importante, que a nossa própria Constituição Federal de 1988 cuidou em deixá-lo bem expresso em seu artigo 225, inciso VII, externando:
“Art. 225 - Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.
§ 1º Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao poder público: (...)
VII - proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade. (...)
Nos dias de hoje, torna-se quase impossível acreditar na ignorância do homem quanto a realidade de que os outros animais também são seres passíveis de sentimentos, que são possuidores de memória, sensações e emoções como a dor, alegria, angústia, fome, sede... Dentre tantos outros aspectos cognitivos e/ou afetivos em comum aos seres humanos que, muitas vezes, de humanidade pouco resta.
É preciso que tenhamos consciência ética e jurídica sobre como tratá-los e preservar, com o uso das atribuições do Direito, as suas vidas.
“A evolução das leis deve acompanhar a evolução da sociedade, nessa ordem”.
Considerações importantes:
O mundo está cheio de certezas. Antes de julgar, pense que você poderia estar na nossa mesma situação. Já sofremos e continuamos sofrendo muito com a morte do Tommy.
A intenção é ajudar, orientar, conscientizar e fazer o possível para evitar que tudo isso se repita.
Sabemos que muitos passaram ou ainda vivenciarão situações como a nossa e se pudermos auxiliar salvando uma vida de uma possível tragédia advinda de uma causa semelhante ao que ocorreu com o nosso filho, já será o suficiente. A nossa missão não se trata "apenas" sobre o Tommy, mas sim objetivamos atentar as pessoas sobre a proteção aos animais em geral; lutando pela justiça e bem-estar desses seres que não tem "voz" e são plenos de instinto e pureza.
Finalizando, o Tommy já entrou em nossas vidas sem a sua cauda e somos contra a amputação descriteriosa, ou qualquer outros procedimentos que visam apenas fins estéticos.
Também seguimos a cada dia aprendendo, tendo conhecimento sobre o que não percebíamos anteriormente sobre os animais e, mais importante, colocando em prática ações que mudam as nossas vidas em respeito a eles.
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